segunda-feira, 27 de abril de 2020

Querido Diário

Querido Diário, caramba, faz tanto tempo...
Tanto tempo que a gente se fala.
Na verdade ja faz muito tempo que nao falo comigo mesma.
A ultima vez que escrevi foi em 2011.
Quase 10 anos depois tive 3 filhos e vivo uma vida de merda.
Meus filhos sao incriveis, sim, meus filhos são incríveis.
Mas nada aconteceu como eu tinha previsto.
 Aquela jovem cheia de energia, cheia de sonhos, promissora, se tornou uma velha gorda, cheia de estrias e cabelos brancos.
Que nao gosta de cozinhar, que nao gosta do marido, que nao gosta de muitas coisas.
Chata. Sem assunto. Desinteressante.
Procurando nos outros, do lado de fora, um assunto que possa ser desenvolvido.
Fui morar em Paris, que merda, quem diria que Paris é uma merda.
Pior do que Bangu com Coronavirus.
Me casei com uma porra de um pobre, nao so de dinheiro mas de vitalidade.
Faz 4 anos que nao vou ao Brasil. 4 anos que nao vejo meu pai, meus amigos, meus avos.
Que nao recarrego minhas baterias onde, um dia, achei que era a minha casa.
Me casei com um homem que além de nao me oferecer uma vida decente, nem a mim e nem aos meus filhos, é alguém com quem eu nao tenho vontade de compartilhar absolutamente nada.
Nao odeio ele. Também nao amo. É o pai dos meus filhos. É isso que é então, ter um pai dos filhos?
Alguém poderia ter me contado antes deu assinar essa porra de contrato?
Lembro de quando eu morava em Rio das Ostras.
Eu ja tinha conhecido esse excunjuro, mas ele nao era nada pra mim.
Eu tinha uma amiga, a Pomy. Ela era tao linda...
 A gente ria, se divertia, saia, bebia, tomava sol. Como a gente era linda.
Nao precisava de mais nada, a gente so precisava ser aquilo, jovem e linda.
E parecia que depois tudo ia dar certo so porque a gente era jovem e linda.
Eu beijava a boca de um moreno lindo, cheiroso, com perfume de piprioca.
Eu nao queria viver com ele, so queria beijar aquele homem lindo.
As coisas eram boas naquela época.
Nao tinha a França, nao tinha virus. Nao tinha morte. Nao tinha limbo.
Converso com meus filhos sobre a Teoria da Relatividade.
Jesus. Eternidade, imortalidade, fisica quântica.
Eles sao tao pequenos, mas eles têm que entender que tudo isso nao existe.
Quero acreditar que nao estou presa aqui, porque assim como Jesus, eu nao existo.
Nao existe o passado, nao existe o futuro e nao existe o presente.
E eu nao tenho que me deitar ao lado desse homem que eu nem sei se eu nao amo.
Queria comprar roupas novas, passear, ir na casa da minha avo.
Viver como se o futuro fosse bom e como se eu nao precisasse realmente me preocupar com isso porque estava tao longe.
Sem ter que me preocupar se vamos ter dinheiro pra pagar o aluguel.
Porque é claro, que se eu sair daqui, que é tao bom, que eu sou linda, jovem e tomo sol, nao é pra ir morar num pais excroto de gente excrota onde faz frio e eu nao tenho dinheiro nem sentido.
Uma das primeiras coisas que me chamou atenção aqui na França foi uma placa numa estrada.
Um lado tem escrito "Toutes les directions" e o outro "Autres directions".
Como podem haver outras direções além de todas?
Hoje é isso que eu quero encontrar, outra direção que nao seja as mesmas, todas, alguma outra solução que nao seja as obvias.
*
*
*
*
*
A musica de hoje é Pernambucobucolismo
*
Eu vou fazer
Um movimento, amor
Uma canção pra inventar o nosso amor
Eu vou fazer
Uma revolução
Eu vou pra Londres, vou pra longe
Sei que vou
Onde luar
Não há igual aqui
Igual aqui não há
Outro lugar
Eu sinto bucolismo
Eu sinto bucolismo
Pernambucobucolismo
Eu vou fazer
Um movimento, amor
Uma canção pra inventar o nosso amor
Eu vou fazer
Uma revolução
Eu vou pra Londres, vou pra longe
Sei que vou
Onde luar
Não há igual aqui
Igual aqui não há
Outro lugar
Eu sinto bucolismo Eu sinto bucolismo Pernambucobucolismo Pernambucobucolismo






Um comentário:

Graziella disse...

Um diaria é a melhor forma de descobrir quem somos nos!! Seja feliz minha amiga!! Você merece