sábado, 22 de novembro de 2008

"a felicidade é como a gota de orvalho" - II


Não me lembro de ter sido tão feliz assim antes. Passei quase 1 terço da minha vida com muito medo. Muito medo, muito medo, muito medo... Tinha que respirar bem pouquinho, porque coisas bem ruins poderiam acontecer se eu respirasse muito. Medo por mim, medo pelos meus gatos, medo pela minha família... Eu gostava dele. Mas era uma coisa bem "síndrome de Estocolmo". Tinha muito horror a me deitar com ele. Tinha tanto medo dele que chegava a me esconder embaixo da mesa, tremendo... Ele chegava e eu me sentia pequenininha... Queri ser um inseto, desaparecer. Não conseguia fazer nada. Nada funcionava. Parecia que quanto mais tudo desse errado, melhor pra ele. Quando eu era criança o medo era porque éramos muito duros. Mas era um medo que só vinha às vezes, porque a gente era feliz. A gente brincava muito, se divertia, nem lembrava que mal tinha grana pra pagar o aluguel e a escola. Minha mãe era a melhor mãe do mundo e meu pai tocava lindamente. Então o medo nem vinha muito. Mas depois que cresci, meus pais se separaram e começou a ficar mais estranho. O dinheiro, que era pouco, diminuiu. Minha irmã ficou doente. Tudo ficou esquisito. Daí ele apareceu. E eu fui, quis nem saber. Comecei a descobrir um outro tipo de medo, um medo de perder tudo que tinha, tudo que não tinha. Fui cavando meu próprio buraco. Aumentando as dependências. Foram 7 anos aumentando dependências. Queria morrer, queria muito morrer. E isso era ruim, bem ruim. Principalmente porque às vezes eu era feliz. E ser feliz no meio de muito medo é esquisito. Eu sabia que tinha que ir embora, mas não tinha coragem. Achava que não seria capaz de me sustentar, sustentar minha família, meus gatos. Meus gatos ainda estão com ele. Todos os dias prometo a mim mesma que os buscarei. Não sei quando, mas eu farei isso. Demorou mais mais ou menos uns 2 anos para que eu tomasse coragem MESMO para ir embora. Então chegou o dia em que dei um basta. Não suportava mais olhar pra ele. O medo virou ódio, virou rancor, virou nojo, virou ojeriza. Não conseguia enxergar mais nenhuma qualidade nele. Sinto muito. Tudo que havia de bom ficou muito ruim. Hoje tento, todos os dias, ter lembranças boas. Mas as ruins são mais fortes.
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Hoje estou pensando: nunca fui tão feliz. Estou tranquila. Nunca soube o que é tranquilidade. Estamos na casa da vovó, que de certa forma também é nossa. Minha irmã está muito, muito bem, tomando os remédios, fazendo exercícios, motivada, trabalhando. Eu e minha mãe estamos afinadas, sempre amigas, sempre parceiras. A loja já está praticamente fechada, o preço é justo e a localização excelente. Temos um carro. Temos alguma reserva. As coisas tendem a ficar melhores. E mais do que pensar que as coisas vão melhorar, não vejo mais tantas possibilidades de elas piorarem. Não tenho mais medo. Não tem ninguém olhando pra mim como se eu fosse a culpada de tudo. Nem sempre bater é o pior tipo de violência. Vejo coisas que eu queria muito que acontecessem começando a acontecer. Sinto saudades dos meus amigos, principalmente da Mari e da Sibia, até porque eu sei que elas também precisam muito de mim. Sinto saudades do João, mesmo sabendo da inconstância e incerteza do que temos. Quero que ele seja feliz, comigo ou sem-migo. Tenho vontade de escrever. Sinto-me mais criativa, mais preparada. Estou tendo idéias de livros. Parece que as coisas estão acontecendo mais, fluindo mais. E sem medo.
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É muito bom saber que as coisas passam, muito bom. Como um anel que eu tenho e que emprestei pra minha amiga Vivi (tava precisando mais do que eu): "Isso também passará". Quando lembro as diversas fases ruins que a minha família passou, fico imeeeensamente feliz de saber que as coisas passam.
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E eu tenho uma certeza plena de que ainda vai melhorar muito. Não é que ainda vamos ser felizes: nós JÁ SOMOS FELIZES.
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Pela minha família eu dançaria tango no teto. Pela minha família eu moraria em Casimiro de Abreu e seria feliz por isso.
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E para ilustrar esse momento, uma canção da Marisa Monte, "O Rio".
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"Ouve o barulho do rio, meu filho
Deixa esse som te embalar
As folhas que caem no rio, meu filho
Terminam nas águas do mar
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Quando amanhã por acaso faltar
Uma alegria no seu coração
Lembra do som dessas águas de lá
Faz desse rio a sua oração
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Lembra, meu filho, passou, passará
Essa certeza, a ciência nos dá
Que vai chover quando o sol se cansar
Para que flores não faltem
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Para que flores não faltem jamais"
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Um comentário:

Angelica Bessa disse...

Ah prima, engraçada a forma como você fala que faria qualquer coisa pela sua família. Nossa, eu hoje queria ser filha de chocadeira.